segunda-feira, 19 de outubro de 2009

O PADRE É POP

Encontrei semana passada na minha caixa de correio -a de verdade, não a de email- um folhetinho informando sobre a realização de um show denominado "Eu e o Tempo", estrelado pelo padre Fábio de Melo. Confesso penitente que até então nunca havia ouvido falar do padre.
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Ao ler o folheto, deparei com uma mensagem curiosa: a disponibilidade de venda de ingressos para "Pista" e "Cadeira VIP". Pensei na hora estar diante de um Robin Hood, que tira dos ricos para dar aos pobres -afinal, num evento religioso, é de se imaginar que toda a receita seja destinada à caridade, à assistência, ao social. Pensei também, rindo, que as áreas VIP poderiam ser ocupadas pela alta hierarquia religiosa, com uma plaquinha "Reservado aos Bispos e Cardeais", com as cadeiras VIP toda em madeira entalhada e veludo vermelho. O folheto ainda previa a grandiosidade do acontecimento ao destacar a "abertura dos portões às 18:00", cedo para um show com início marcado para as 20:30.
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Até aí o assunto ficaria na esfera dos fãs, dispostos a pagar R$ 15 por um espaço na arquibancada ou R$ 40 por uma cadeira. Vai quem quer e quem pode pagar, apesar dos preços nada populares.
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Mas o susto mesmo veio no sábado 17/10, dia seguinte ao show, com a publicação do edital do Processo de Inexigibilidade 061-SMA/09, da Prefeitura de Poços de Caldas, informando que o Executivo, por meio da Secretaria de Turismo, propôs a contratação da banda Talentos 1, da empresa Talentos Produções, para apresentação musical no "Show do Padre Fábio de Melo", no estádio municipal, a um custo total de R$ 40 mil reais, justificando que esse valor era destinado ao pagamento de músicos, iluminação, transporte, alimentação, hospedagem e outros, tudo isso devidamente "carimbado" em pareceres da Secretaria de Turismo e ainda da Procuradoria Geral do Município.
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Aí você pergunta: e o padre com isso? Padres fazem voto de pobreza -não dá para "contratar" um padre. Então cria-se uma estrutura em torno do "astro" para acompanhá-lo. Quem foi, quem segue o trabalho musical do religioso, gostou do que viu. A mensagem que ele leva também é inquestionável.
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Perturba-me é o fato de que a verba tenha saído dos impostos não só de católicos, mas de evangélicos, judeus, muçulmanos, candomblés, budistas, espíritas e todas outras religiões, seitas, correntes ou credos de qualquer natureza das pessoas que habitam a cidade, e que portanto têm o justo direito de reinvindicar investimentos semelhantes para eventos com seus líderes. Também incomoda o fato de haver discriminação de espaços num show religioso, afinal, se são todos filhos de Deus, por que uns sentam mais longe e outros mais perto? Ao pé da letra, quem pode contribuir mais com a caridade não precisa receber um benefício maior.
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É assunto delicado? Pode parecer, mas essa não é uma discussão religiosa. É sim política, econômica, social e, como católico e cidadão, não sou obrigado a aceitar que o município -o Povo, eu inclusive- arque com esse gasto. Essa é a discussão. Se o show é bom, bem produzido, ou se o padre é "fofo", como cheguei a ouvir, não interessa. Como também não interessa nesse caso o meu gosto pessoal. Pode ser que eu tenha perdido a noção do dinheiro. Ou R$ 40 mil não é um bom dinheiro?
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Um comentário:

  1. Caruso

    O padre Fábio de Melo não deu entrevista para emissora nenhuma, não falou da instituição que supostamente o show estará beneficiando na cidade (me parece que na igreja da vila cruz) nem sabia o nome dos padres do município, não agradeceu a prefeitura pelo "apoio", enfim, demonstrou estar muito mais para pop do que realmente um padre se é que ainda existe diferença...
    o padre foi apadrinhado pela cidade mas, compadre como este, prefiro ficar sempadre.

    abraços

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