sábado, 25 de julho de 2009

O ENIGMA DA PIRÂMIDE

Sugiro que você leia este artigo sentado. Ao final suas pernas poderão estar bambas. Um remédio para o fígado é importante -pode ajudar a tirar aquele amargo “gosto de otário” da boca, o mesmo que estou sentindo agora, culpa do “Termo de Ratificação de Inexigibilidade” publicado em 23 de julho de 2009, pleno sábado, pela Câmara Municipal de Poços de Caldas, cuja reprodução o leitor vê na imagem acima.
.
Vou esmiuçar o conteúdo do tal edital. Trata-se da contratação -sem licitação- do centenário arquiteto Oscar Niemeyer para que seu escritório elabore o projeto arquitetônico de um futuro prédio para a Câmara Municipal, a ser eventualmente construído num ainda indefinido Paço Municipal, pela estonteante importância de R$ 1.250.000,00 (vou escrever, para que fique bem claro: um milhão, duzentos e cinqüenta mil reais).
.
O edital, assinado pelo presidente da Câmara Municipal, o vereador e empresário Marcus Togni, justifica a contratação do famoso e não menos polêmico arquiteto nos termos dos artigos 13, I e 25, II da Lei 8.666/93, conhecida como “Lei das Licitações”, cujo conteúdo busquei no site da Presidência da República e você confere a seguir.
.
O artigo 13, inciso I da referida lei diz o seguinte: “Para os fins desta Lei, consideram-se serviços técnicos profissionais especializados os trabalhos relativos a estudos técnicos, planejamentos e projetos básicos ou executivos”, enquanto o artigo 25, inciso II, afirma que “É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização”.
.
Para entender, o edital quer fazer crer que, para a contratação do badalado Niemeyer, não se exige licitação, visto que ele ou seus prepostos prestarão um serviço técnico profissional para o qual é inviável qualquer competição, ou seja, não há no Brasil profissional à altura do contratado, por conta de sua notória especialização. Não concordo. Acho que há milhares de arquitetos no Brasil, muitos deles em Poços de Caldas, em condições de apresentar um projeto de qualidade e, principalmente, dentro dos princípios necessários e esperados para um prédio público. E quais seriam esses princípios? São os apontados em nossa própria Lei Orgânica Municipal, que preconiza, em seu artigo 27, parágrafo único: “a construção de edifícios e obras públicas obedecerá aos princípios de economicidade, simplicidade e adequação ao espaço circunvizinho e ao meio ambiente”.
.
Parece complicado? Não é. Os edifícios públicos devem ser pautados na economia de projeto e construção, sendo simples no conceito e adequados ao espaço em que se inserem. Imagine um autêntico Niemeyer “plantado” em plena zona sul, área de muitas carências –habitação, saúde, educação, rodeados de prédios administrativos norteados pela Lei Orgânica. Certamente destoará e não levará para lá o que a região precisa.
.
Muitas foram as defesas que vi e ouvi sobre o tema. Uma delas diz respeito à necessidade premente de Poços de Caldas ter um Paço Municipal, o que contribuiria para a melhoria dos tráfegos -tanto das informações dentro da burocracia oficial, reunindo a administração e os três poderes num mesmo espaço, quanto dos automóveis que abarrotariam o centro por conta do relacionamento de seus motoristas e passageiros com os diversos órgãos do poder público. Mas basta um simples passeio pelo centro aos sábados para perceber que o trânsito independe do expediente oficial. Quanto à determinação de que, por exemplo, todas as secretarias devam estar no mesmo espaço, o argumento parece frágil em tempos de comunicação on-line, contribuindo o fato de que raramente o cidadão procura mais de um serviço oficial ao mesmo tempo.
.
Outro ponto levantado foi a importância de termos uma obra de Niemeyer na cidade, que até atrairia mais turistas. Sinceramente não vejo assim. Sou de família de artistas (se você quiser conhecer um pouco dessa história, ficarei honrado com sua visita ao site http://www.pintorescaruso.blogspot.com/), alguns bastante premiados, e reconheço a importância de uma obra de arte, como são as obras do arquiteto. Mas acho mais justo ainda que, se alguém quer ter um Picasso na parede, que o faça não com o dinheiro público de uma cidade com problemas financeiros em meio a uma crise mundial, necessitando investimentos sociais e não artísticos.
.
Se alguém ainda duvida da crise, a mesma edição do Jornal de Poços que traz o edital dessa “compra”, publica o decreto 9.593, que “dispõe sobre o contingenciamento e limitação de empenhos do orçamento municipal”. Literal e sabiamente, o prefeito Paulo César Silva determinou o fechamento das torneiras, considerando, de acordo com o decreto, “a adoção de procedimentos visando o sustentável equilíbrio financeiro”, devendo “ajustar suas contas ao equilíbrio entre despesas e receitas públicas”, submetendo os agentes públicos que realizarem despesas em desacordo com as normas à apuração de responsabilidade.
.
O enigma é esse, então: no Palacete da Francisco Salles, a ordem é economizar de verdade, decretado e publicado, pois as receitas estão abaixo do orçamento. Atravessando a praça e chegando ao plenário do Edifício Bauxita, nossos vereadores “furam o bloqueio” e dão-se o direito de comprar uma obra de arte para o povo, afinal estão lá também para cuidar dos interesses da população.
.
Mas não termina aí. De acordo com um vereador que ouvi semana passada, o “valor do projeto em si não é o problema” (!), a dificuldade vai ser construir o prédio, que “vai ter 7 mil m2 e custar uns 14 milhões de Reais” (!!). Só para você saber, o orçamento da Câmara em 2009 é de R$ 9.620.000 e um hospital privado ora em construção na cidade terá 7.800 m2.
.
Se você, como eu, não concorda com esse projeto, manifeste-se. Mande um email ou telefone para o seu vereador. E, principalmente, guarde para as próximas eleições (2010 está aí, e alguns querem ser deputados) os nomes daqueles que investiram mal o dinheiro do povo, em plena crise mundial, jogando para um futuro incerto um projeto que certamente entrará para história de Poços de Caldas. Pela porta dos fundos.
.
Links importantes:
.
.

7 comentários:

  1. O assunto é polêmico, assim como foi quando o mesmo presidente da Câmara propôs o acordo que acabou por levar "Poços de Caldas" à Marquês do Sapucaí, sendo tema da Escola Beija-Flor. Naquela ocasião o município deveria investir R$ 1.200.000,00.
    Após este valor ter sido aprovado pela câmara e pelo executivo, vieram as críticas. Mas o caso não era apenas enviar o dinheiro para a Escola. Foi desenvolvido um projeto pelo qual haveria o envolvimento da sociedade poços-caldense no evento. Assim, quando um turista comentasse sobre o assunto, as pessoas teriam informação consistente para dar. Bem, este dinheiro da iniciativa privada era para este projeto. Como choveram críticas, o prefeito Sebastião Navarro resolveu que este dinheiro seria utilizado para diminuir a conta dos 1,2 mi. Então a coisa ficou capenga:
    Para a população em geral foi gasto 1,2 mi do dinheiro do povo quando a iniciativa privada entrou com 700 mil. Por outro lado, a mesma população não foi envolvida no processo, o que causou desinformação, campo fértil para os críticos. Para piorar, a Beija-Flor teve um desempenho pífio naquele ano, ficando apenas em 5º lugar, quando buscava o tetra campeonato inédito. Lembra-se que, no ano posterior ela foi novamente campeã.
    http://pocosdecaldastwitter.blogspot.com/

    ResponderExcluir
  2. Rubens, veja como estou certa. Como posso ficar quieta, aqui em campinas ou em São Paulo, lendo uma notícia dessas. Afinal o valor é irrisório mesmo e a Câmara precisa de um novo prédio, com um projeto do Niemeyer, por esta quantia que daria para ser usada de tantas outras formas em Poços e ajudar a população e não fazer glórias ao senhor presidente da Câmara Marcus Togni. Por isto ele nem respondeu meu e-mail sobre a nossa prima Larissa e o acidente dela do dia 12 de julho e muito menos o problema dos caminhões que passeiam pela cidade ao bel prazer porque não obedecem o secretário de Defesa Social Sergio.
    Que bom que você me alertou a princípio para ler sentada, porque se estivesse em pé, desmaiaria.
    Aamanhã terei muito trabalho.
    Me aguardem senhores vereadores....

    Um abraço

    Sabrina

    ResponderExcluir
  3. Para Poços de Caldas seguramente ter um edifício com arquitetura assinada pelo Niemeyer é realmente uma oportunidade única. Entretanto, muitos prédios foram reformados em vez de restaurados em Poços, aliás, foi mais BARATO! Veja a Urca, o Palace Cassino, totalmente descaracterizados em relação à construção original. Já que tudo está se acabando mesmo, seria bom contratar um Engenheiro Civil para fazer o projeto arquitetônico, que tal? Sairia mais barato, não? Afinal, Poços não precisa de projeção e nada de qualidade. Vamos empobrecer suas construções e demolir seu visual, pois a população merece o que pensa.

    ResponderExcluir
  4. Contratem um engenheiro civil para fazer o serviço de arquitetura, sai mais em conta!
    Quanto ciúmes...

    ResponderExcluir
  5. Nao podemos nos esquecer que temos em Poços de Caldas uma faculdade de Arquitetura e Engenharia Civil.. Temos uma PUC orasss!!!

    Porque nao darmos chance a estes estudantes(futuros profissionais) e professores a mostrar que nossa faculdade tem profissionais a altura e acima de tudo capacidade!!!

    Garanto que o valor nao seria bem este...

    Alias... se fosse aberto um concurso ou algo, muita gente pagaria para fazer este projeto para a cidade.. quem nao queria estampar seu nome em uma obra destas???

    ResponderExcluir
  6. Segue artigo retirado do site concursosdeprojeto.org

    PROJETOS SEM CONCURSOS, OBRAS PÚBLICAS SEM CONTROLE

    “A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia e a selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa…”

    Esse é um trecho do Art. 3° da Lei de Licitações (Lei 8666/1993), que define – entre outras coisas – como deverão (ou deveriam) ser contratados os projetos e serviços relativos às obras públicas.

    Esse instrumento legal também estabelece – como nosso leitor já deve estar cansado de ler neste portal – que “ressalvados os casos de inexigibilidade de licitação, os contratos para a prestação de serviços técnicos profissionais especializados deverão, preferencialmente, ser celebrados mediante a realização de concurso”, como deveria ser o caso dos projetos de arquitetura, urbanismo e paisagismo.

    Pois bem. Acaba de ser aprovada no Congresso Nacional a Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2011 que isenta as obras da Copa 2014 e das Olimpíadas de 2016 das exigências da Lei de Licitações[i].

    Perguntamos: será que isso significa que os bilhões de reais a serem consumidos nesses grandes empreendimentos públicos poderão ser aplicados segundo os princípios básicos da ilegalidade, da pessoalidade, da imoralidade e da desigualdade? Afinal, dispensa de licitação significa falta de transparência, ausência de controle e espaço à corrupção e ao desvio de verbas públicas.

    (...)
    Enfim, eventos que poderiam ser oportunidades de crescimento, de desenvolvimento e de sustentabilidade (para utilizar a palavra da moda) se mostram cada vez mais como oportunidades de favorecimento, desvio e corrupção – consequências quase que inevitáveis de projetos sem concursos e obras públicas sem controle.

    http://concursosdeprojeto.org/2010/07/08/projetos-sem-concursos-obras-publicas-sem-controle/

    Ana Nicolau

    ResponderExcluir
  7. Em Poços já há um projeto de Niemeyer.
    Ganhei do amigo com quem trabalhei por mais de 20 anos. Estou procurando uma forma de realizar a casa que ele me fez. E tem vitrais de Marianne Peretti e jardins de Fernando Chacel, outros ( um ex) parceiros.
    Ainda vou divulgar.

    paulo romeu pereira bissoli
    www.myzoom.com.br

    ResponderExcluir