"Parem as rotativas!" era a frase que usávamos ainda crianças, inspirados nos filmes ou gibis, quando tínhamos uma importante notícia a dar. Mas tinha quer ser uma notícia importante o suficiente para que, se fosse na vida real, determinasse a parada total da impressão do jornal, que entraria então em "segundo clichê".
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E as rotativas pararam. Deixou de circular, pelo menos em sua versão impressa, um dos mais importantes veículos do país, o Jornal do Brasil. Sobre isso, reproduzo pequeno artigo do grande Alberto Dines, publicado em 16/7. Acompanhe:
JORNAL DO BRASIL
Morte sem epitáfio
Os sinos não dobram quando fecha um jornal, mas dobram pelo jornalismo. Nenhum jornal é uma ilha – menos um jornal, menor a imprensa. Menos um diário, menor o continente, o mundo, a humanidade.
Pífia, lamentável, a repercussão do anúncio do fim do Jornal do Brasil impresso. Ninguém vestiu luto – só os jornalistas – porque há muito aboliu-se o luto. O luto e a luta. Sobreviventes não lamentaram, dão-se bem no jornalismo morno, sem disputa. Juntaram-se para revogar a concorrência e enterraram a porção vital do seu ofício. Esqueceram a animada dissonância, preferiram a consonância melancólica.
Qualidade e poder
O derradeiro confronto jornalístico no Rio talvez tenha se travado no início dos anos 70 (ou fim dos 60) quando Roberto Marinho decidiu que O Globo não poderia ficar confinado ao esquema de vespertino e passou a circular aos domingos. Em represália, Nascimento Brito decidiu que o JB invadiria a segunda-feira. Encontro de gigantes, disputa de qualidade. Mesmo com a ditadura e a censura como pano de fundo.
Sem competição, o jornalismo perdeu o elã; desvirtuado, virou disputa pelo poder. Exatamente isso atraiu Nelson Tanure, o empresário que investe em informática, estaleiros e faz negócios pelo negócio. Não lhe disseram que empresário de jornal não precisa escrever editoriais, basta gostar do ramo e ser fiel a ele.
Simbólico: o fim do JB impresso foi confirmado na edição de quarta-feira (14/7) sob a forma de anúncio, publicidade. Aquela Casa não acredita em texto. E o seu jornal morreu sem epitáfio".
Tema importante, que poderia acender uma discussão sobre o papel da imprensa local. É preciso pensar na competição, intensificar a busca pelo "furo" e tornar o press-release oficial material periférico. Refletir sobre o fato de aparentemente termos muitos jornais, quando ignoramos os muitos veículos que deixaram de circular na cidade, ao longo dos anos. Acabar com o padecimento sob pressões características dos anos de chumbo: "vou cortar seu anúncio" deve ser objeto de riso nas redações.
E ter em mente, sempre, que o cliente, de verdade, é o leitor.
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Debate aberto.
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"O jornalismo reflete muito bem a aventura da modernidade.Ele é a melhor síntese do espírito moderno. Por esse mesmo motivo, o processo de desintegração da atividade, seu enfraquecimento, sua substituição or processos menos engajados¨(que já não buscam "a verdade", que já não questionam a política ou os políticos, que já não apostam numa evolução para uma "sociedade mais humana") é um sintoma de mudança dos tempos e dos espíritos. Mudamos para uma época semelhante àquilo que Nietzsche atribuia a toda a modernidade: o de ser uma "época fraca", decadente, niilista... Não havendo mais bandeiras por que lutar, não existindo mais "destino feliz da humanidade", não havendo mais diferenças nítidas entre as culturas e os países, todos eles sob o manto conciliador (não raro totalitário) do neoliberalismo, a civilização planetária torna-se uma totalidade sem amanhã." (Ciro Marcondes Filho).
ResponderExcluirO jornalismo refletiu sempre, ao longo do tempo, a história da humanidade. Cabe então uma reflexao ampla: qual o tempo que estamos vivendo? Por quais valores estamos "lutando"?
A informação saiu das mãos do clero e da sociedade burguesa e após a invenção dos tipos móveis por Gutenberg, o jornalismo teve que sustentar-se economicamente e aí, a "coragem civíl" se enfraqueceu. O jornalismo passou a ser mercadoria, um produto, e o valor de troca não é a informação, mas sim, o poder e o dinheiro.
Wiliam de Oliveira.